domingo, 19 de fevereiro de 2012

Marionetes e Música

Britolfo. Era assim que o viam e era assim que nascera – estranho, deslocado e cansado. Tão cansado que nascera com uma peculiaridade de não chorar quando veio ao admirável mundo novo. Pensavam os tolos que a desencaixada criança estava morta, engano. Era viva, tão intensa na sua forma que observava cada gesto e tomava cada aprendizado como incentivo para brilhar em tanto conhecimento.

Já crescida, comia livros. Estudava de literatura até filosofia. De arte até psicologia e suas ênfases antropológicas e etimológicas. Era inteligente, conseguia passar coisas absorvidas em longas noites mal dormidas até quando permanecia quieto.

No meio social, era tonto; fingia-se. Procurava ocultar seu conhecimento para não entediar as outras pessoas, então se tornava a massa tediosa, voltando a sentir-se como no nascimento; cansado. Brito achava que se estudasse grandes obras de revolucionários e pensadores poderia entender o porquê do cansaço sobre a humanidade. Viu que era tudo igual, previsível. Por mais mistério ou abertura que um grupo ou indivíduo tivesse, seria tudo igual – com o mesmo fim.

Como se trata de uma breve e cômica história, Brito neste parágrafo já estava grande. Já morava sozinho, trabalhava e vivera grandes amores, grandes viagens. Claro, com o dobro de conhecimento e, agora, sabedoria. Neste espaço entre a vida e a morte, Britolfo resolveu sair para dançar em um dia exclusivamente agitado, ou pelo menos ele o julgava assim. Colocou uma roupa básica, mas elegante. Sempre com seu jeito estranho e sério – seus óculos estavam tortos e sua carteira era furada.

Nada iria abater aquele sentimento de liberdade engendrada sobre outras gaiolas em paradigmas impostos pelo ambiente proposto. Brito sentia-se alegre, procurou um local para beber e posteriormente dançar, pois já sabe que muito não vai encontrar nestas redondezas, além de luzes e maquetes. Seu conhecimento e bagagem sofisticada de nada mais valiam naquela noite.

Brito era sozinho, de poucos amigos. Mas os poucos que tinha chamavam-os de irmão, por isso nesse dia foi com seu melhor amigo. Davam-se muito bem, pois riam das obviedades dessas ocasiões, riam daquela casualidade, mas também lamentavam por tanta mesmice.

Entraram para dançar. A selva estava cheia, repleta de pessoas que também se desligaram do mundo. Desligaram suas preocupações, seus encantos e argumentos. Brito e seu amigo sabiam disso. Por isso dançavam em volta de marionetes. Marionetes vagas que podem ser vistas no trabalho, no teatro ou no cinema.

Dançavam e abraçavam-se, conversavam na pista fora de hora. Saíam para olharem-se e agradeciam um ao outro pela companhia. Mas cansavam-se. As marionetes tornavam-se fumaça quando as luzes pararam de piscar. Todos iam embora e, por sua vez, Brito sentia-se cansado. Lembrou que não importa o lugar, no final sempre se sentia cansado. Cansado de estar entre marionetes, talvez cansado daquela luz, da bebida. Dos teatros e cinema, embora adorasse. Lembrou também que se sentia entediado e cansado sobre quase tudo, menos escrever. Relembrou de todos os cansaços que já sentia, de todas as promessas que ouvira e sabia que seriam só palavras de atos previsíveis, surpreender-se-ia senão fossem falsos.

O que há de errado em cansar-se com o final, se teremos um novo começo, Britolfo?

Então olhou para seu amigo e sorriu. Colocou a mão sob seu ombro e foram para casa, sabendo que a cada passo seria uma volta e meia pelas marionetes.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Holanda fará eutanásia em domicílio. Por aqui, aliviar a dor é crime

A Holanda deve lançar, em março, a primeira unidade móvel do mundo para fazer eutanásia em domicílio. De acordo com matéria de Cláudia Collucci, na Folha de S. Paulo, a equipe vai atuar quando a família ou os médicos se recusarem a dar drogas letais a pacientes terminais que desejam morrer. Desde 2002, a eutanásia é legalizada no país, onde cerca de 2700 mortes assistidas são realizadas anualmente. As seis unidades móveis, compostas de um médico e um enfermeiro cada uma, devem elevar em mil esse total.A Federação dos Médicos Holandeses é contrária à iniciativa porque acredita que alguns pacientes poderiam ser tratados. A ministra da Saúde, Edith Schippers, disse ao parlamento que as unidades são “para pacientes que sofrem insuportavelmente sem nenhuma perspectiva de melhora”, mas cujos médicos não estão dispostos a fazer eutanásia.Têm sido frequentes os pedidos à Justiça na Europa e Estados Unidos para que doentes terminais com dores insuportáveis cometam eutanásia. Querem ter o direito de partirem lúcidos e ao lado dos familiares, mas muitos apelos vêm sendo solenemente ignorados – pelo governo, por médicos, pela família. Acabam cometendo suicídio sozinhos, outros ajudados na clandestinidade. Na verdade, pouco importa, porque em ambos os casos significa que o Estado e a sociedade lhes deram as costas.Histórias de médicos que cometem eutanásia (para além da ortotanásia, que é deixar a vida e a morte seguirem seu curso e se encontrarem) diariamente nas UTIs não são raridade no Brasil. Pessoas com sensibilidade para entenderem quando o seu semelhante quer dar cabo de sua existência devido a um sofrimento extremo e não tratável e responder a pedidos desesperados. Normalmente, aumentam a dose de medicação até o ponto de falência do organismo.Aqui no Brasil, estamos longe de debater nos termos da Holanda, por mais que o tema seja polêmico por lá. Falar disso, gera olhares de nojo e repreensão em muita gente. Mas não deveria, afinal não é uma discussão sobre a morte, mas sobre a vida e sua dignidade, ou seja, de como as pessoas querem terminar os seus dias. Afinal de contas, a nossa vida pertence a nós. Se alguém acredita que pertença a alguma entidade sobrenatural, dedique sua vida a ela. Mas não impeça a garantir de políticas públicas.O Estado deve proteger a vida. Mas que tipo de vida? Aquela sem qualidade nenhuma, de dor e sofrimento, apenas para cumprir uma exigência legal, filosófica ou religiosa?


A Indiferença

"Primeiro levaram os comunistas
Mas eu não me importei, porque não era nada comigo
Em seguida elvaram alguns operários
Mas a mim não me afetou, porque não sou operário

Depois prenderam os sindicalistas
Mas eu não me incomodei, porque nunca fui sindicalista
Logo a seguir chegou a vez
De alguns padres
Mas como nunca fui religioso, também não liguei

Agora levaram a mim
E quando percebi
Já era tarde."

Bertolt Brecht

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Eu te amo.. Não diz tudo.

Você sabe que é amado(a) porque lhe disseram isso?

A demonstração de amor requer mais do que beijos, sexo e palavras.

Sentir-se amado é sentir que a pessoa tem interesse real na sua vida,

Que zela pela sua felicidade,
Que se preocupa quando as coisas não estão dando certo,

Que se coloca a postos para ouvir suas dúvidas,
E que dá uma sacudida quando for preciso.

Ser amado é ver que ele(a) lembra de coisas que você contou dois anos atrás,

É ver como ele(a) fica triste quando você está triste,
E como sorri com delicadeza quando diz que você está fazendo uma tempestade em copo d'água.

Sente-se amado aquele que não vê transformada a mágoa em munição na hora da discussão.

Sente-se amado aquele que se sente aceito, que se sente inteiro.
Aquele que sabe que tudo pode ser dito e compreendido.

Sente-se amado quem se sente seguro para ser exatamente como é,
Sem inventar um personagem para a relação,
Pois personagem nenhum se sustenta muito tempo.

Sente-se amado quem não ofega, mas suspira;
Quem não levanta a voz, mas fala;
Quem não concorda, mas escuta.

Agora, sente-se e escute: Eu te amo não diz tudo!

Arnaldo Jabor